Historicamente, a relação entre Ciência
e Fé tem passado por várias fases, hora por distanciamentos, hora por alianças.
Em se tratando da Medicina, muitas foram as evoluções tecnológicas e
científicas, a exemplo da terapia gênica e da clonagem. No entanto, ainda que
representem progressos nas formas de tratamento, vez por outra, ainda produzem
afastamento por porte daquela parcela da sociedade que permanece acreditando na
influência da fé na cura de certas doenças.
Todavia, uma outra questão que
surge ainda mais latente é, como falar de espiritualidade com um
indivíduo de forma ética, sem passionismo religioso e com decoro?
Nem de longe, parece-nos que o
estabelecimento de regras e tratados de procedimentos comuns possam dar conta
de satisfazer a amplitude desta questão, dado o caráter pessoal e
individualista que agrega em si, além das inúmeras circunstâncias a serem
consideradas.
Sabe-se no entanto que, muito
estudos dão conta de que a manifestação da espiritualidade pode afetar a saúde
de forma detectável pela ciência, ou seja, é possível demonstrar que os
aspectos psicológicos, sociais e religiosos da vida humana podem afetar o corpo
físico. Tamanha é aproximação que, conforme aponta Koenig (2012, p. 07), “hoje,
existe um campo que vem crescendo bastante, chamado psiconeuroimunologia –
intimamente relacionado à “medicina psicossomática” – que analisa como as
experiências mentais e sociais podem afetar aspectos da saúde física.”
Um corpo saudável é aquele em
pleno gozo de sua saúde mental, de suas funções imunológicas e endócrinas, bem
como, suas funções cardiovasculares, com níveis de estresse equilibrados e que
as anormalidades comportamentais de algum destes sistemas costumam provocar
áreas de deficiência e em estágios mais avanços, agravos em forma de doenças
físicas.
Se analisarmos o caso específico
das nações ocidentais até o início do século passado, veremos a predominância
de uma cultura balizada em pensamentos lineares e causalistas, onde o
encantamento com avanços tecnológicos, configuram um consequente isolamento,
quiçá, estímulo aos conflitos entre as questões espirituais e o pensamento
científico. Notadamente, a década de 1950, trará ares renovadores à estas
visões deterministas, pois como nos afimam Tillmann e Oliveira (2004, p. 55):
“É, em nosso entender, provável que as
manifestações religiosas de Einstein, primeiramente expressas nos anos 1950,
sejam, de parte do mundo científico da modernidade, um dos primeiros passos
facilitadores desta aproximação. Nesse então, Einstein referiu que um cientista
podia, efetivamente, ser um homem religioso. Ele, por exemplo, acreditava em
uma perspectiva “cósmica, não antropomórfica”, de Deus. Apontava aí que o
antropomorfismo era uma necessidade do homem comum para a religiosidade e suas
interfaces com a Medicina, a Psicologia compreender a divindade. O cientista
iria por outro caminho, mais abstrato, menos sincrético. Mas, ambos, sujeito da
multidão e sujeito de ciência, podiam ver-se irmanados ante a circunstância
divina.
Num primeiro momento e dada a
notabilidade de Einstein no campo científico, tem-se a impressão de que o mundo
moderno saberia como lidar simultaneamente com espiritualidade e ciência. Vale
lembrar que para a ciência constituir-se enquanto área de domínio disciplinar,
precisou romper paradigmas dogmáticos impostos pela religiosidade que davam
conta de explicações naturalizadas ou de ordem divina para os acontecimentos
cotidianos ou fenômenos circunstanciais, sendo portanto, considerados
inquestionáveis.
Parece que em outras áreas, esta
aproximação aconteceu de forma mais espontânea que na medicina, já que as
atitudes médicas continuam tratando saúde e doença apenas sob seu viés
antagônico, conforme apontam os estudos realizados por Diniz (2006, p.)
(...) a saúde seria o pleno exercício dessa
normatividade e a doença sua falência. A vida, não sendo fundada por nenhum
princípio que a transcende, é o fundamento de todos os princípios e o limite a
qualquer outra realidade. A vida humana é o objeto da prática médica; a
medicina “existe como arte da vida e porque há homens que se sentem doentes e
não porque existem médicos que os informam de suas doenças – o Pathos é
anterior ao Logos. O médico tomou, explicitamente, o partido do ser vivo; ele
está a serviço da vida, e é a polaridade dinâmica da vida que ele expressa
quando fala em normal e patológico”
São inegáveis os numerosos os
progressos científicos na medicina e no campo da biologia, juntamente com o
crescimento assoberbador de conhecimentos. Ao final, o que se percebe é a
necessidade de subespecializações.
Há que se dizer que, quando um médico
opta por enxergar holisticamente o paciente que se encontra sob seus cuidados,
é comum que seja alvo de estranhamento por parte dos colegas de profissão,
sobretudo, em se tratando daqueles que concebem que as consultas médicas não
devam atender o global, oferecendo ao paciente muito além da resolução de
problemas físicos, psíquicas e espirituais.
Além disso, ainda que a racionalidade
médica reconheça a pessoa enferma como um indivíduo único, singular, dotado de
capacidade auto-restauradora, bem como, os benefícios representados pela
espiritualidade, ainda carece de evidências sólidas e substanciais.
Recentemente, vemos o termo
espiritualidade ampliado para incluir conceitos psicológicos positivos, como
significado e propósito, conexão, paz de espírito, bem-estar pessoal e
felicidade. Porém, ao
considerarem a complexidade e o tempo médico que seria requerido para poder
tratar em profundidade os pacientes, vários autores mostram-se reticentes em,
diretamente, prescrever um envolvimento médico amplo que considere a abordagem
de temas espirituais durante as consultas.
REFERÊNCIAS
KOENIG.Harold
G. Medicina, religião e saúde: o encontro da ciência com a espiritualidade.
Disponível em http://imagens.travessa.com.br/capitulo/L_PM_EDITORES/MEDICINA_RELIGIAO_E_SAUDE_O_ENCONTRO_DA_CIENCIA_E_DA_ESPIRITUALIDADE-9788525427199.pdf ),
acessado em 02 de dezembro de 2016.
TILLMANN.
Ieda A.; HORTA, Cristina L. OLIVEIRA. Flávio M. de. A religiosidade e
suas interfaces com a medicina, a psicologia e a educação: o estado da arte.
p.53 - 67 in Espiritualidad e qualidade de vida.
Disponível em http://biblioteca.unilasalle.edu.br/docs_online/livros/espiritualidade_e_qualidade_de_vida.pdf#page=54,
acessado em 02 de dezembro de 2016.
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