INTRODUÇÃO
“- Agora me diz, Ricardo, por que tu disseste que é
por minha causa que estás interessado em Freud?
- Ora, essa tua conversa de que eu tenho um outro por
dentro. Fui checar direitinho e tive que concordar contigo: tenho mesmo. Só que
todos têm. E tudo porque na verdade a gente nunca sabe direito quem a gente é.
A ponte entre o inconsciente e o consciente é maior do que a Rio-Niterói, nunca
conseguimos enxergar a travessia que liga esses dois lugares da alma humana,
tão distanciados um do outro.” (BENTANCUR,
1995, p. 06)
Penso
que um dos maiores desafios de nossa existência é conhecermo-nos a nós mesmos,
a tal ponto de, sabiamente, aprendermos a lidar com nossas qualidades e
defeito, em meio ao arcabouço de emoções que o cotidiano vital nos congratula
todos os dias.
Nesta
perspectiva e já em fase de encerramento de mais uma etapa de nossa caminhada do
Curso de Pedagogia - Modalidade de Ensino a Distância, passo a compartilhar
algumas reflexões e aprendizagens, correlacionando-as ao desenvolvimento das
atividades encaminhadas pelas Interdisciplinas e procurando ilustrá-las com
minhas experiências ao longo deste semestre.
REFLETINDO SOBRE
A IMPORTÂNCIA DO PEAD EM MINHA VIDA
Tenho encarado o ingresso no Curso de Pedagogia – Modalidade
de Ensino a Distância – como um divisor de águas em minha vida.
Sabia que ao contar para as pessoas mais próximas, certamente
lhes surpreenderia, justamente porque bem conhecem a falta de paciência que faz
parte de minha personalidade. Então, antes de mais nada, realizar as
atividades, debruçar esforços na procura de bons resultados, tem me trazido
gratas sensações de êxito, embora ainda apresentem-se entremeadas por súbitas
vontades de desistência no transcorrer do caminho.
A partir das leituras propostas pela Interdisciplina O trabalho educacional: conhecimento,
aprendizagem e subjetividade, desenvolvimento e aprendizagem sob o enfoque da
Psicologia I, mais especificamente, refletindo
sobre os estudos freudianos acerca dos mecanismos de defesa, percebi que nossa
personalidade se constitui e diferencia-se por uma série de identificações e
que a impaciência na verdade, potencializa a impossibilidade de coligações
eficientes entre os pensamentos, negando a aceitação conscientes dos fatos,
cada um a seu próprio tempo e forma.
Este primeiro esboço de racionalização, trouxe à tona a necessidade de
revisão em minha postura profissional, uma revisitação consciente a algumas
velhas angústias, companheiras constantes em meu fazer pedagógico.
Lembro que em uma das aulas presenciais da Interdisciplina Fundamentos da Alfabetização, a
professora Annamaria nos propôs uma atividade onde o enunciado do exercício
estava em português, mas o restante, encontrava-se escrito em árabe, em meio a
algumas imagens ilustrativas. A intenção era de que percebessemos o desafio que
uma criança em idade de alfabetização enfrenta até internalizar as memórias
procedurais e semânticas que antecedem o desenvolvimento da motricidade
necessária para a aprendizagem da escrita das letras e seus sons.
Enquanto tentava realizar a atividade (mais me baseando nas imagens
que propriamente nas letras arábicas), ia pensando nas diferentes linguagens
que utilizo durante as minhas aulas e no quanto influenciam para que os alunos
consigam apropriar-se dos conhecimentos inicialmente pretendidos, dentro do
tempo projetado para a realização de tais atividades, segundo os planejamentos.
Até que ponto minhas aulas poderiam ser classificadas como dinamicamente
dialógicas, sem incorrer no estabelecimento de paradigmas dogmáticos, baseados
em cansativos monólogos?
Então, lembrei de Dona Cristina, protagonista de um dos documentários
que assistimos em uma das aulas presenciais da Interdisciplina Escolarização, espaço e tempo na perspectiva
histórica. Ao passo que a produção ia retratando sua história, subentendia-se
a mensagem de que a memória nunca é estável, pois sempre que revisitamos nosso
passado, ressignificamos o nosso olhar.
Buscar ressignificações. Que desafio!
Em outro momento, assistimos o
vídeo clip da música “The wall” (Pink
Floyd - 1979). Na sequência, as professoras iniciaram um debate coletivo,
onde deveríamos analisar o contexto das imagens do vídeo, levando em
consideração o texto “Maquinaria Escolar”, escrito pelos sociologos franceses
Fernando Alvarez-Uria e Julia Varela.
Atentando às falas das colegas de curso e das professoras, foi
possível que eu ressignificasse a leitura que eu havia realizado do texto, a
partir da análise das entrelinhas reflexivas suscitadas pelos autores e neste
sentido, percebi o quanto são importantes as trocas de experiências que os
encontros presenciais nos possibilitam, embora, particularmente, eu opte mais
por ouvir, do que explicitar o que penso oralmente, pois percebo que consigo me
esboçar muito melhor escrevendo que necessariamente, falando.
A percepção do aluno ativo, parte do mobiliário escolar, demanda
compreensões no que se refere as particularidades que constituem seu universo, analisando-se
as formas pelas quais manifesta seu desejo de aprender, em meio as
transferências e contratransferências que vai estabelecendo em meio ao contexto
social onde está inserido.
Desta forma, a Interdisciplina Infâncias
de 0 a 10 anos, nos propôs ponderações sobre nossa sociedade pós-moderna,
marcada pela influência midiática, direta ou indiretamente, uma vez que este
aluno, enquanto cidadão em desenvolvimento, necessita de novas formas de
tratamento, pois conforme afirmou o personagem Ricardo à sua mãe, no livro
“O menino escondido”, escrito por Paulo
Bentancur: “Hoje, o mundo está mais
veloz, mais avançado. As crianças atualmente sabem de coisas que no teu tempo
vocês levaram dez anos a mais para aprender.”
MINHAS REFLEXÕES
ACERCA DAS ATIVIDADES E LEITURAS ENCAMINHADAS PELAS INTERDISCIPLINAS NESTE
SEMESTRE
Crianças encurraladas entre muros altos, se limitam a “receber
a luz” que vem do professor, embora nem todos sejam iluminados. Com dedo em
riste e expressão de autoritária, a figura de um professor catedrático e
inquestionável, ensina repetitivamente, enquanto as batidas cadenciadas de um
baixo, pouco a pouco, vão ofuscando o som das vozes, as quais deixa-se de se
ouvir ao passo que a música se inicia, falando da redundante insistência de
palavras e regras na formatação dos alunos. Ao final da aula, seres apáticos
saem desta escola, caminhando por uma cenário tempestuoso, sem sol.
As cenas descritas acima, referem-se a algumas partes do vídeo
clipe da música “The wall” (Pink
Floyd), produzido em 1979. Note-se que, em momento algum, estes alunos são
vistos enquanto portadores de potencialidades, tampouco, indivíduos sociais
capazes de construir um futuro sob novas perspectivas, permanecendo nos
bastidores dos acontecimentos sociais, subjugados a condição de meros
receptores a-históricos.
Este cenário, ambientado em anos marcados pela Guerra Fria, pela
bipolarização do espaço mundial entre Socialistas e Capitalistas, nos choca a
ponto de provocar profundas indagações ao trazer explícita a ideia de uma
infância associada a forma de ver o mundo pelos olhos dos adultos, onde
“adultos em miniatura”, uniformizados em suas vestes, padronizados na prática
das atividades e jogos, recebem cobranças igualitárias quanto aos resultados
avaliativos.
A organização social desta Escola, com características
pós-feudalistas e profundas influências dos dogmatismos religiosos, sobretudo,
cristãos, também marcará a
caracterização da realidade escolar de nosso país, conforme apontam os
estudos realizados por Clarice Nunes, em seu texto “Os (des) encantos da
modernidade pedagógica”.
Já nos primeiros anos de nosso país republicano, ainda
marcados pelo acesso eletista à educação, a sociedade brasileira via-se
surpreendida pela implantação das primeiras indústrias e sua necessidade
latente pela utilização de mão-de-obra especializada, ainda inexistente. Desta
forma, a popularização do acesso às Escolas urgia pelo crescimento
significativo na quantidade de ofertas, sem que isso tenha se traduzido em
igual proporção no que tange a qualidade do ensino que passou a ser ministrado.
Pensando sobre esta escola com funcionalidades ordenadas,
regulamentadoras, destinadas ao recolhimento e instrução dos alunos,
padronizada em modelos dos séculos passados, lembrei-me da minha formação
escolar fundamental e de ensino médio, entre 1987 a 1999, iniciada e finalizada
na mesma instituição: meu querido Colégio Estadual Arnaldo Busato, com toda a
sua rigidez organizacional, onde “tudo deveria funcionar porque todos éramos
responsáveis por zelar pelo bom andamento do público”, conforme costumava nos
dizer, incansavelmente, nosso lendário Professor Darci Signor.
Freud, versando sobre os determinantes psíquicos que levam um
indivíduo a ter o desejo de aprender, nos diz que este processo está associado
as noções de domínio, visão e sublimação, dependendo em grande parte das razões
que motivam a busca pelo conhecimento. Para se aprender, é preciso haver uma
relação afetuosa, de fascínio mútuo que viabilizem experiências subjetivas e
inter-subjetivas. Pois, foi novamente revisitando minhas memórias que lembrei
das aulas de Português com a Professora Rachel Martinni e toda a austeridade de
suas cobranças em minhas produções textuais, as quais nunca vinham desacompanhadas
de elogios à minha dedicação, ao capricho de minha letra ou ainda, sem me
surpreender com sua atenção especial para algum detalhe que havia me escapado
despercebidamente. Ao realizar a leitura das dedicatórias que costumava deixar
ao final das correções de meus trabalhos, sentia uma gostosa sensação de
reconhecimento pelos meus esforços, uma sensação que inflava meu ego, deixando
no ar as expectativas pela próxima oportunidade em que eu poderia lhe
surpreender novamente.
Hoje, trabalho em uma escola marcada pela presença de modelos
arquitetônicos e físicos dos séculos passados, igual a tantas outras, onde nós,
professores, nos vemos desafiados a não reproduzir os modelos da educação
tradicional que recebemos.
Todavia, enquanto leciono, gosto de ser um pouco da Rachel
Martinni e um pouco do Darci Signor, porque percebo o quanto que os alunos que
nos chegam, necessitam desta postura, em meio a estes novos e heterogênicos
contextos socioculturais que caracterizam nossa sociedade pós-moderna e que nos
surpreendem dia a dia.
No transcorrer deste semestre, entre as várias propostas de
estudo que envolveram conteúdos específicos de cada Interdisciplina, confesso
que meu interesse aconteceu de forma mais efetiva com as leituras e reflexões
encaminhadas pela Interdisciplina Escolarização,
espaço e tempo na perspectiva histórica, muito porque minha primeira
formação acadêmica é em Geografia. Além disso, chamou minha atenção o respeito
às individualidades que as professoras demonstraram no transcorrer do semestre,
seja na brevidade de retornos às atividades, seja pelos encontros presenciais
que nos proporcionaram, recheados de linguagens contemporâneas, exemplos
práticos e atividades diferenciadas.
Por este motivo, procurei condensar as aprendizagens que
angariei no transcorrer deste semestre e que julguei pertinentemente relevantes,
elencando-as na produção de meu Manifesto pela Educação, atividade que realizei
sob a forma de um vídeo, posteriormente anexado ao youtube, que pode ser
visualizado no seguinte endereço: https://www.youtube.com/watch?v=LQvPzz3e6Jw, ou ainda, ao final deste, entre os anexos. Penso
que esta escolha, ilustra boa parte de minhas perspectivas e pensamentos acerca
da forma com que concebo a prática educativa.
3. MINHA
TRAJETÓRIA NO PEAD: ENTRE A SUPERAÇÃO DOS OBSTÁCULOS E AS PERSPECTIVAS DE FUTURO
Em nossos dias, nossas escolas e todas a amplitude de
ambiguidades que foram as constituindo no desenrolar dos tempos modernos,
anseiam por olhares de (des) encantos, pois continuam a inspirar contradições,
a ansiar pela criação de novos desejos e pela negação de unilateralidades
históricas, em meio a este mundo letrado do século XXI, onde nem todos os
brasileiros, logram inserção, infelizmente!
Durante este trimestre,
minha trajetória no curso de Pedagogia – Modalidade de Ensino à
Distância, fez com que esta premissa se tornasse passível de análise, porque
fui convidada a refletir sobre a sociedade pós-moderna em que vivemos,
revisitando alguns conceitos e intencionalidades que costumam balizar minhas
práticas educativas cotidianas.
No entanto, voltando minha atenção para os obstáculos que perfizeram meu
caminho durante este semestre letivo, pontuo dois, em específico: inicialmente,
preciso repensar as consequências da constante falta de tempo que minha
exaustiva jornada de trabalho (50 horas semanais), tem trazido para minha
qualidade de vida. Em segundo lugar, embora ciente das características que
fazem parte da Interdisciplina Seminário
Integrador II, como o próprio nome sugere, preciso pensar em uma forma de
desenvolver a paciência que tais propostas demandam, justamente porque o
desenvolvimento de atividades coletivas configura entre as coisas que costumo
denominar como os calcanhares de Aquiles
de minha existência.
Em se tratando de didáticas de ensino, foram congratulantes as
superações pessoais que a Interdisciplina Fundamentos
da Alfabetização me oportunizaram, pois ainda que eu seja professora do
Ensino Fundamental, até então, eu não tenho experiência alguma com turmas que
estejam nesta importante fase do ensino. Desta forma, o enfoque humanístico com
que a professora conduziu suas propostas de atividades, foi algo que me soou
profundamente enriquecedor, pois ao passo que instigava minha criatividade,
fazia-me atentar para os detalhes que este processo demanda e o quanto é
desafiador alfabetizar uma criança.
O processo de aprendizagem, só acontece de forma efetiva quando
aliado ao desenvolvimento de novas atitudes e concepções, pois a medida que o
indivíduo conscientiza-se de suas potencialidades, vai aprimorando as formas
como desempenha suas diferentes
atividades. Desta forma, seria possível sintetizar as reflexões trazidas
pela Interdisciplina O trabalho educacional: conhecimento,
aprendizagem e subjetividade, desenvolvimento e aprendizagem sob o enfoque da
Psicologia I, em uma única frase: somente aquilo que nos é significativo é
que produz aprendizagem.
Mas, como nós, professores, devemos lidar com estas infâncias
que nos chegam, a ponto de lhes tornar o conhecimento atrativo, seja ele
lógico-matemático, físico, social ou procedural? Por que as crianças que chegam
até nossas escolas, não são mais como eram antigamente? Estas, entre outras
questões inquietantes, que nos surgem sem trazerem consigo fórmulas eficazes de
condutas pedagógicas, pautaram as atividades e leituras da Interdisciplina Infâncias de 0 a 10 anos.
Aos poucos, vemos surgindo novas e diferentes gerações, cheias
de características e vontades que em nada, lembram a infância assexuada,
preconizada em séculos passados. A naturalização das campanhas de marketing e
suas estratégias sutis de sedução, vem incutindo em nossas infâncias a prática
consumista cerceadas por valores efêmeros, descartáveis e individualistas, que
tendem a eternizar a cultura do “ter”, em detrimento da cultura do “ser”, como,
infelizmente, bem percebemos na cultura contemporânea.
Em meio a tudo isso, não há como pensar em perspectivas
futuras sem partir do princípio de que é fundamental que a Escola propicie
ambientes onde o aluno possa buscar soluções na convivência com os pares,
possibilidades de desdobramentos e saídas factíveis, que lhe satisfaçam os
desejos e os ensine a lidar com suas frustrações, desenvolvendo noções de
respeito pelo próximo e pelo diferente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entendo que a aprendizagem é um processo contínuo que se
manifesta desde a mais tenra idade e continua a propagar-se ao longo de toda a
vida e, por isso, não pode ser concebida tão somente sob esferas padronizadas e
hierarquicamente instituídas, dada a sua complexidade. Enquanto fenômeno intrínseco, é a forma pela
qual cada indivíduo social vai (re) configurando suas particularidades, seja a
partir de experiências impíricas, seja nas correlações que vai estabelecendo
com os diferentes meios.
Fazemos parte desta sociedade marcada pelo predomínio do
processo de globalização e pela perversidade do sistema capitalista de
produção, sob suas mais diferentes conjecturas. Tais realidades vem colocando
por terra muitas daquelas concepções que detínhamos enquanto construções
historicamente constituídas, costumeiramente norteadoras de nossas práticas de
ensino-aprendizagem.
Nós, professores, assim como nossas crianças, nos encontramos
em meio a este cenário confuso e marcado pela invasão de modismos efêmeros,
tentando, da melhor forma possível, dar conta de toda a rotina que caracteriza
o cotidiano escolar, assim como, de toda a parafernália burocrática que o
cerceia.
O que resta, é a dúvida de estarmos conseguindo ou não, dedicarmos
a devida atenção a estes indivíduos sociais em formação, estes mesmo que,
casualmente, nos surpreendem quando deparamos com “pessoas invisíveis de papos imprevisíveis”,
como ilustra o narrador-personagem da história contada por Paulo Bentancur, em
seu livro “O Menino Escondido”.
REFERÊNCIAS
FISCHER. Rosa
Maria, Dispositivo pedagógico
da mídia: formas de educar na (e pela) TV. Educação
e Pesquisa, São Paulo, v. 28, n. 01, p. 151-162, jan./jun. 2002. Disponível em
http://moodle.ufrgs.br/course/view.php?id=34843