terça-feira, 13 de junho de 2017

Nós da Educação, sobre a construção do Projeto Político Pedagógico

Nós da Educação, sobre a construção do Projeto Político Pedagógico

Entrevista com Ilma Passos Alencastro Veiga
 (Pós-Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas)


A literatura sobre o Projeto Político Pedagógico só começou a surgir com mais ênfase após apromulgação da LDB, em 1996. O PPP nada mais é que um processo de tomada de decisões democráticas. É um movimento que deve ser participativo, um movimento coletivo. O projeto, ao mesmo tempo que constrói este movimento, dá a ideia de que deve ser vivenciado por professores, alunos, funcionários da Escola, representantes da Comunidade Escolar: todos participam da concepção, todos executam e todos avaliam.
Na história da Educação, a própria palavra não vem da Educação. Somente com a LDB é que a palavra Projeto é assumida pela educação, passando a falar-se m Projeto Político Pedagógico. O Político denota a influência de Paulo Freire. O ato pedagógico está interligado ao político e vice-versa.
O PPP pode ser concebido dentro de duas perspectivas: numa perspectiva técnica é mais um modismo. Surge por força de lei e vira um modismo. Acabou o modismo, todo mundo esquece. Se o PPP chega dentro de uma perspectiva técnica, burocrática e de uma visão de educação mais conservadora, hoje, ele está se tornando indispensável. E numa perspectiva mais edificante, o PPP é emancipador, está calcado num princípio de educação enquanto prática social e que emancipa o homem. Tem um compromisso com os princípios ou com as finalidades da educação brasileira, expressas hoje  no artigo segundo da LDBEN que diz que é o pleno desenvolvimento do aluno, o preparo para a cidadania e o exercício para o trabalho. Então, PESSOA, CIDADANIA E TRABALHO é o compromisso maior que o PPP deve ter. Há um compromisso com a qualidade formal e com a qualidade política. A qualidade formal é no sentido de garantir às escolas as estruturas, as condições físicas, administrativas e de equipamentos para o funcionamento e a qualidade da educação. Do ponto de vista político, o compromisso do PPP é com a qualidade da educação para todos, sabendo que os governos tem tido um esforço muito grande para democratizar o acesso à Escola, mas ainda não conseguimos a questão da qualidade da educação e muito menos, a questão da permanência. Ainda temos uma grande defasagem idade/série, temos ainda muita repetência e muita evasão.
Esse compromisso do poder público com relação à qualidade política é um compromisso que vem sendo perseguido pelos diferentes governos do país.

Como o PPP pode colaborar para a qualidade na Escola?

O PPP, sendo trabalhado no bojo de uma concepção democrática e emancipatória e a própria legislação brasileira coloca bem claramente que a gestão democrática se dá através de diferentes mecanismos colegiadas dentro da Escola e o primeiro que ele coloca é a questão da eleição do diretor, mas não fica só por aí. Também temos outros mecanismos que a própria LDBEN coloca que é a questão do conselho escolar, o Conselho de Classe, as APMS, os grêmios estudantis para que o aluno tenha um espaço para além da sala de aula para o desenvolvimento de lideranças. O Brasil é um país sem liderança. A nossa liderança é hereditária e com isso perdemos o espaço para criação de lideranças quando você fecha o Grêmio Estudantil. Qualidade está ligada a uma participação maior da comunidade.

Qual a diferença entre um PPP de uma escola pública para o de uma escola privada?

Uma é regida pela própria mantenedora  e que tem a sua autonomia para definir estratégias de desenvolvimento e de elaboração do projeto. E temos  a Escola pública, regida pelo Poder Público, com sistema de manutenção diferente. Quando a LDB coloca a questão da Gestão Democrática, refere-se ao ensino público. Todavia, ao passo que o PPP passa a agregar as pessoas, faz com que as instituições tenham força. Se eu elaboro, executo e avalio, eu também sou dona deste projeto. Ali passa a conter parte da minha trajetória, das minhas argumentações, ideias e a gente defende as ideias.

Quais são os objetivos do PPP?

O projeto tem alguns objetivos: Ele tem que gerar a identidade da Escola e daí a sua singularidade. Cada escola possui uma realidade, um alunado, uma arquitetura diferente. O segundo ponto importante é que a Escola tem que inovar, gerar um novo tipo de ensino para a produção de conhecimento, considerando o aluno como produtor deste conhecimento. A Escola se abre para dar voz para o aluno e este é o ponto de partida para a inovação das metodologias. O professor precisa considerar que o aluno possui uma trajetória de vida.
Um terceiro aspecto é que o PPP tem o poder de desvenlar os conflitos e contradições que permeiam o processo educativo que ocorre dentro da Escola. O aluno, realiza a leitura de mundo, entendendo o que se passa na realidade social e que interfere no seu processo de formação.
E finalmente, o objetivo de avaliação. Hoje, recebemos uma avaliação externa, feita por órgãos externos à Escola. A Escola tem de desenvolver esta capacidade de se avaliar, seja suas condições de trabalho, seu processo, as ações pedagógicas desenvolvidas. No meu ponto de vista, são quatro grande objetivos seriam: identificação, inovação, avaliação e politização.
De que forma a LDB institui o PPP?
A legislação em seus artigos 11, 12 e 13 trata sobre o Projeto, que deve ser feito pelos estabelecimentos de ensino, seja sob a forma de Projeto ou de Proposta Pedagógica, não havendo diferenças entre ambas as designações. Ao falar sobre a incumbência dos profissionais da educação, chama a atenção para a importância de que o PPP seja construído sob a ótica da participação e isso é um avanço. Mais a frente, nos artigos 14 e 15, fala sobre a Gestão Democrática, fortalecendo ainda mais o princípio da participação e estabelece os princípios da autonomia da Escola: autonomia financeira, pedagógia e administrativa. Aí, reside o grande diferencial entre a Escola Pública e a Escola Privada. Enquanto a Escola Pública tem uma autonomia pequena do ponto de vista financeiro porque ela tem uma manutenção por parte do governo. Em se tratando de sua autonomia pedagógia e administrativa, é um processo de construção.

Burocracia x Operacionalização: como se dá esta relação no PPP?
Trata-se de uma relação complicada porque o PPP começa com a leitura da prática da Escola, ou seja, começa fazendo um retrato da Escola. Exatamente quando eu levanto os problemas (pedagógicos, administrativos, burocráticos, financeiros, problemas com relação ao desenvolvimento de pessoal, de professores) que a Escola encontra no seu processo de desenvolvimento da Educação, evidentemente que é necessário estabelecer prioridades, já que a Escola não vai dar conta de resolver todos os problemas, já que alguns fogem da esfera de resolução da própria Escola. Definindo prioridades, eu estabeleço obstáculos, forças restritivas que tem dificultado o desempenho de qualidade da Escola. Então aí, entre a tomada de decisões e a operacionalização, é preciso prever encaminhamentos para reduzir estes espaços de encaminhamentos que reduzam estes sofrimentos, conflitos e tensões.
Quais são os elementos que precisam ser observados na organização, no desenvolvimento e na avaliação de um PPP?
Estabelecer as finalidades -  É preciso desenvolver o aluno em sua integralidade, sua cidadania e qualificação para o trabalho. Então, a Escola deve se perguntar quais são as formas pelas quais tem procurado atingir estas finalidades da LDB.
Avaliar é a questão do currículo -  o início da década de 90, tivemos um currículo definido em âmbito nacional, os chamados Parâmetros Curriculares Nacionais sem considerar as questões das especificidades regionais. Como a Escola organiza curricularmente os conhecimentos, a partir do artigo 26 da LDB, estruturado disciplinarmente. O Estado define políticas orientadoras, não políticas definidoras de ações, mas quem concebe  a forma como estas serão empregadas no cotidiano é o professor que está em sala de aula, que vivencia a realidade da escola onde atua. Traz o tom da prática, o tom da realidade mesclada à teoria.
A gestão administrativa e pedagógica da Escola.
O tempo escolar - regulamentado em 800 horas letivas, um tempo cronometrado para as salas de aula.
As relações de trabalho – que devem ser primadas na solidariedade, na co-participação
A avaliação - vinculada a auto-avaliação, que partem da própria Escola.


O PPP ajuda a compreender a educação regionalizada?
Sim, porque uma das características do PPP é exatamente a identificação da  Escola e o que buscamos nesta ideia, é que a Escola mostre a sua marca, sua cara, suas singularidades, sua vocação, a forma como trabalha com os alunados daquela região em que se insere. Desta forma, o projeto é inconcluso e ondicionado à formação continuada de professores, significa que constantemente, precisamos estar constantemente o revisitando.
Como se relacionam as dimensões técnicas, políticas e sócioculturais quando o assunto é PPP?
A parte técnica do Projeto, (a sua organização, elaboração, avaliação, ou seja, o conteúdo do projeto),   parte política (compromisso com a intencionalidade que deve estar diretamente ligada ao desenvolvimento pleno do aluno, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho:  sujeito, pessoa, educando e trabalhador: aí reside o compromisso do PPP com esta intencionalidade) e a questão do social é considerar que a Escola pública atende hoje uma parcela da população que até então não tinha acesso à Escola. Há uma diversidade cultural muito grande adentrando à Escola.
No entanto, no caso da violência por exemplo: não compete à Escola a resolução deste problema. Ela precisa de parcerias, mecanismos para atendimento destas questões que extrapolam a sua capacidade de intervenção direta. A Escola tem uma parcela de responsabilidade quanto às questões sociais, mas há um limite. É papel da Escola trabalhar as questões que preocupam a sociedade como drogadição, sexualidade precoce, violência, etc., mas não compete a ela resolver estes problemas, apenas prestar esclarecimentos. Para isso, existem outros setores públicos que devem andar em parceria com a Escola para resolver questões desta natureza.
O professor passou a assumir papel que não lhe compete, a sociedade joga nas costas da Escola doses de responsabilidade que muitas vezes não lhe competem! Aí entra o PPP, que no campo das operacionalizações, uma vez que levantadas estas questões problemáticas, deve estabelecer quais os órgãos que lançarão esforços para auxiliar na resolução destas questões.

O PPP atua como uma forma de reconstituição do campo do poder dentro das Escolas? Como se dá este processo?

A gestão autoritária, centrada na pessoa do diretor, que antecedia a Gestão Democrática, foi substituído por ideias de instâncias colegiadas para operacionalizar os mecanismos da gestão democrática. Entre estes mecanismos, o primeiro que aparece é a eleição para diretor, além disso temos a formação de Conselhos Escolares. Quando a Escola utiliza bem a ideia de conselho escolar, há um empoderamento de todos os participantes. O resgate dos Grêmios Estudantis também é um espaço para que o aluno tenha voz para além da sala de aula, para a criação de novas lideranças além daquela hereditária. Os Conselhos de Classe e as Associações de Pais e Mestres também são formas de melhor distribuir o poder dentro das Escolas.

Como se dão as relações entre as instituições educativas no contexto social?

No contexto social, se você tem a APM, essa associação estaria ligando com a comunidade. Já o Conselho Escolar possui representantes diretos desta comunidade. A escola, inserida numa realidade social, precisa ter um vínculo a ponto de saber o que esta realidade social tem que pode  fazer intersecção com o papel da Escola no movimento deste PPP. Esta participação por parte de todos é preciso que todos os atores sintam-se acolhidos pelos espaços escolares. O conceito de família mudou e a Escola precisa encarar isso, enfrentar estas questões que são sociais e que também merecem espaço para debates.  Muitas vezes, os responsáveis não conseguem acompanhar a vida escolar de seus filhos, por exemplo. Essa é uma questão que compete a Escola encontrar mecanismos de comunicação que possibilite estas trocas, caminhos que estejam de acordo com a clientela que lida. Não é tarefa fácil, mas é importante este movimento que aproxime à família da Escola.

De que maneira a educação colegiada influencia a elaboração do PPP?

O PPP precisa ser construído a partir do chão da Escola e isso implica que vários muros que impedem a relação coletiva da Escola sejam derrubados. O PPP é um grande guarda-chuva dentro da Escola porque tem de ser desdobrado em vários planos de ensino de acordo com a quantidade de disciplinas que se ministra já que é na sala de aula que o PPP se concretiza. Esse nível de coerência é muito importante, sobretudo quando todas as disciplinas correlacionam-se horizontalmente. A participação ativa de todos os professores, colabora com visões diferenciadas. Esta visão de professor participante, permite a coletivização das ações.





Nenhum comentário:

Postar um comentário